Redução do número de re-excisões e melhora do resultado cosmético em pacientes com câncer de mama e cirurgia conservadora

Dr. Ricardo Chagas

Prof. Dr. Carlos Ricardo Chagas

Ex Presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia
Coordenador do Curso de Especialização em Mastologia da Escola Médica de Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

 

Muitos trabalhos mostram frequência variável de indicação de novas cirurgias com a finalidade de diminuir o número de re-excisões, para ampliação de margens, com a finalidade de maior segurança da cirurgia conservadora.O Simpósio Anual da Sociedade Americana de Cirurgiões de Mama, de 2015, realizou uma reunião de consenso multidisciplinar sobre esse importante tema. Nessa oportunidade, apresentamos um resumo das recomendações, mesclado com observações de alguns outros autores. A questão, aparentemente simples, é multidisciplinar, requer rotinas e protocolos e é muito importante para evitar ansiedade das pacientes, reduzir custos e otimizar as etapas do tratamento. Atualmente, sabemos que o controle local é função não somente da carga tumoral, mas também da biologia do tumor e do tratamento sistêmico.

Recomendação I: O diagnóstico por imagens deve incluir a mamografia digital. O exame ultrassonográfico não precisa ser uma rotina, apesar de ser muito empregado. O uso seletivo de ultrassonografia (USG) unilateral é recomendado. A USG pode ser menos importante no caso de microcalcificações quando o rastreamento mamográfico apresenta microcalcificações na ausência de massas. A indicação de Ressonância Magnética (RM) de rotina, também, não é recomendada. O emprego de tomografia das mamas não está indicado.

Recomendação II: em relação à biópsia minimamente invasiva de mama (BMIN), pré-cirúrgica, no diagnóstico do câncer de mama – alguns estudos apresentam serem menos frequentes as re-excisões quando o diagnóstico de malignidade é conhecido antes da exérese cirúrgica. Mais ainda, a BMIM oferece a oportunidade de um melhor planejamento terapêutico, existem evidências de que o controle local depende não só da carga tumoral, mas, também, da biologia tumoral e de avaliação de reposta ao tratamento sistêmico. Um tratamento sistêmico adequado diminui o índice recorrência local. Características dos tumores primários, como invasão linfo-vascular, presença de carcinoma intraductal extenso (CIE), que estão relacionados com a recidiva local, variam com o receptor de estrogênio (RE), receptor de progesterona (RP) e HER2 – no tratamento conservador e mastectomia. Provavelmente, isto é válido, também, em casos com quimioterapia neoadjuvante (QTNEO). Pacientes RE positivos menos frequentemente alcançam resposta patológica completa e isto, por outro lado, não tem a mesma implicação prognóstica do que em RE negativas, principalmente triplo negativas, pois as RE positivos podem contar com o benefício da hormonioterapia após a QTNEO e as que expressam HER2 com 12 meses de tratamento anti-HER2.

Recomendação III: a otimização realização das cirurgias conservadoras requer discussões multidisciplinares, que incluam cirurgiões, imaginologistas, patologistas, radio terapeutas e, principalmente, quando se considerar a indicação de quimioterapia neoadjuvante, a opinião de oncologistas clínicos é necessária. O conhecimento do número de lesões, a distância da pele e da parede torácica e a possibilidade de comprometimento da papila podem facilitar a obtenção de margens livres. Uma discussão pós-operatória com os especialistas, também, pode auxiliar na indicação de uma nova cirurgia.

Recomendação IV: em lesões não palpáveis está indicado a marcação pré-operatória com sementes, com fios de arame, ou visualização direta intra-operatória com USG – não tem sido recomendado nenhuma técnica em particular. O emprego de USG pelo cirurgião pode auxiliar na localização e no volume a ser retirado em lesões palpáveis e não palpáveis. A marcação com múltiplos fios ou semente (bracketing) pode ser útil em lesões grandes, multifocais ou em CIE.

Recomendação V: as técnicas oncoplásticas podem diminuir a necessidade de re-excisões em pacientes anatomicamente selecionadas. Podem, ainda: aumentar o número de casos com margens livres com a retirada de bom volume de tecido; realizar a simetrização e melhorar a aparência da mama oposta. Recomenda-se que essas técnicas sejam empregadas somente em um grupo selecionado de pacientes, por exemplo, os tumores pequenos podem ser retirados sem as técnicas de Oncoplastia. Em todos os procedimentos deve ser considerada a colocação de clipes ou outros tipos de marcadores na cavidade cirúrgica para facilitar o planejamento da radioterapia.

Recomendação VI: o benefício da marcação das peças cirúrgicas de três ou mais margens é muito grande, pois orienta o local de ampliações quando necessárias e melhora o resultado estético, pois evita que toda a cavidade seja ampliada, assim, todas as peças de excisões devem ser marcadas.

Recomendação VII:em relação à radiografia da peça cirúrgica, o seu papel primário é a documentação da lesão não palpável marcada antes da paciente deixar a sala de cirurgia.É baixo o nível de evidência de ser um método de avaliação da distância da lesão à margem e que, portanto, diminua as re-excisões, direta ou indiretamente. As peças não devem ser submetidas a compressões durante as radiografias, pois as margens cirúrgicas podem ser lesionadas e comprometer as avaliações. As imagens devem ser obtidas de dois ângulos diferentes, pois, geralmente permitem melhor avalição das margens do que em uma única incidência. Alguns recomendam a avaliação através deUSG e, para tal, o cirurgião deve ter avaliado a lesão antes da cirurgia. A revisão em tempo real pode evitar que a lesão não seja retirada ou direcionar uma ressecção nos casos de margens próximas. Não existem definições sobre o emprego de RM ou com tais objetivos.

Recomendação VIII:existem níveis moderados de evidência que ressecções na parede da cavidade correlacione-se com menores índices de re-operações. É recomendável realizarampliações ou ressecções (shave – retirada de pequenas fatias) nas paredes das margens das cavidades criadas, após tumorectomias ou segmentectomias, em casos de T2, ou tumores maiores, ou T1 com CIE. Minúsculasressecções, que representem somente uma pequena porção da cavidade, não devem ser realizadas. Quando for realizada uma ressecção, a margem final deve ser marcada. A ampliações não marcadas, até mesmo se apresentarem uma pequena porção de tumor na superfície, deve representar uma margem final com tinta e requerem nova ressecção. Alguns cirurgiões realizam ressecções em toda a cavidade, outros fazem ampliações orientadas pela palpação, pelas imagens ou exame anatomopatológico. Estudos recentes mostram vantagens, significativas estatisticamente, da ressecção das margens cirúrgicas (shave versus no shavemargins) em relação ao número de indicações de novas cirurgias em cirurgias conservadoras.

Recomendação IX: o estudo anatomopatológico intra-operatório das margens de tumorectomias podem ajudar a diminuir as re-excisões. Uma revisão sistemática da literatura demonstrou que o estudo intra-operatório das margens cirúrgicas, por congelação ou imprint,consegue tais objetivos através da indicação de ampliações em margens positivas.É baixo o nível de evidência para a avaliação macroscópica exclusiva. A não disponibilidade de recursos ou expertise podem limitar a análise intra-operatória de rotina –pode ser observado que algumas instituições relatam baixos índices de re-excisões sem o seu emprego.

Recomendação X:as recomendações sobre margens cirúrgicas do SSO-ASTRO(SocietyofSurgicalOncology (SSO), em colaboração com aAmerican SocietyofRadiationOncology (ASTRO)) no sentido de não serem realizadas novas cirurgias de rotina em casos de margens próximas,quando não se encontra tumor na tinta, usada pelos patologistas para a marcação das margens em pacientes com carcinomas invasivos. A adoção dessas medidas poderia reduzir as re-excisõesem 40%. O risco de recidiva, segundo algumas meta-análises, pode dobrar em caso de não serem ressecadas as margens positivas marcadas com a tinta. Na presença de margens positivas a necessidade de uma nova cirurgia deve ser avaliada por toda a equipe multidisciplinar e com a opinião da paciente (divisão de decisões), devidamente informada sobre o risco de recorrência em percentagens absolutas para que possa escolher por uma nova intervenção cirúrgica ou não.

As mesmas diretrizes para as margens seriam aplicáveis em subgrupos de pacientes com “tumores de biologia ruim” (triplo negativos, HER2 positivos e de alto grau), em jovens, carcinoma lobular, CIE e nas que não recebem tratamento sistêmico -– não existe comprovação de benefícios da indicação de novas cirurgias quando têm margem sem tinta (tinta negativa). Pode ser considerado, para algumas pacientes, com margens negativas, re-excisões se existirem achados clínicos ou imaginológicos sugestivos de doença residual adjacente.

Tais considerações sobre margens cirúrgicas não incluem paciente com carcinoma ductal in situ (CDIS) ou tratamento neoadjuvante. Em face da falta de consenso em relação a medidas ideais das margens em CDIS puro, as condutas devem ser avaliadas por equipe multidisciplinar e comparticipação da paciente nas decisões. Até que surjam novas evidências a respeito do CDIS as diretrizes do NCCN indicam nova cirurgia se a margem é tinta positiva ou menor do que 1 mm.

Leituras Suplementares:

  1. Landercaspers J, Attal D, Beitch P et al. Toolbox to Reduce Lumpectomy and Improve Cosmetic Outcome in Breast Cancer Patients: The American Society of Breast Surgeons Consensus Conference. Ann SurgOncol. Published online in 1 June 2015.2015 Oct; 22(10):3174-83. doi: 10.1245/s10434-015-4759-x. Epub 2015 Jul 28. Acessoem 13/08/2015.
  2. Morrow M. Progress in the surgical management of breast cancer: Present and future. The Breast (2015). http://dx.doi.org/10.1016/j.breast.2015.07.003. In press.Acessoem 13/08/2015.